Revista Diário - 27ª Edição
ARTIGO JoséSarney Ex Presidente da República l~ Caminhões eestradas E m matéria de greve ninguém tem mais ex- periência que eu. Não em fazê-las, mas a de conviver com elas. Quando fui Presidente da República enfrentei 12 mil e tantas greves - o número exato deve estar nos arquivos da Abin, que sucedeu ao SNI do meu tempo. Noventa por cento delas de caráter político, pois tinham a finalidade de desestabilizar o go- verno, por sua investidura com a morte, sempre lamentada, de Tancredo Neves. O momento era difícil, pois era um período de transição de regi- me autoritário para os ventos da liberdade de uma democracia plena. Sabe Deus o que me custou lidar com elas. Forças políticas e setores do poder econômico não admitiam que tivéssemos sucesso e busca- vam o caos, com vistas em minha deposição. Mas, com as virtudes da paciência quase bíblica, venci essas agruras, a democracia não morreu em mi- nhas mãos e entreguei o país democratizado, com o fim do militarismo (que por definição é agrega- ção de poder político ao poder militar) e vivemos estes anos de absoluta liberdade, eleições livres, alternância de poder e a cidadania forte. Agora vemos o quanto de perplexidade e in- certeza vive o país com a paralisação das estra- das e, como consequência, o fim do abastecimen- to. Tenho sido profeta, embora melhor seria que não o fosse. Condenei a Constituição de 1988 di- zendo que o país ia ficar ingovernável. E ficou. Condenei esse modelo rodoviário, com o suca- teamento das estradas de ferro e a resistência de ' ' Na raiz dessa grande eaté agora não resolvida crise estáa vulnerabilidade de nossa malha de transporte, a totalmente estrangulada malha rodoviária ea ausência de redes ferroviária e hidroviária. Somos totalmente dependentes dessas estradas rodoviárias sempre estragadas e sobrecarregadas. Disse que isso ia acontecer e aconteceu. um país tão cheio de rios navegáveis às hidrovias. Contra minha opinião, a Constituinte acabou com o Fundo Rodoviário Nacional, e os recursos que o constituíam foram transferidos para o ICMS, com a destinação em grande parte para a ação política. Recebi um boné de ferroviário quando preguei e fiz um plano para implantação de ferrovias no país. Quis fazer a Norte/Sul, mas não deixaram, e Lula muitas vezes penitenciou-se por combatê-la - e a fez. Concluí a Estrada do Aço e a inaugurei. Tentei fazer a Leste-Oeste, ligando Mato Grosso aos portos de nossa Costa, e deixar uma rede ferroviá- ria que pudesse ser operada mais barato e diminuir nossa dependência do petróleo. Não deixaram. Quase me matam, tantas críticas e resistências! No Maranhão salvei a ferrovia São Luís/Tere- sina dos planos de Geipot - o Grupo Executivo de Integração da Política de Transporte, que a partir de 1965 comandou o setor na área federal - de erradicação das estradas deficitárias, como fize- ram no Pará com a Bragantina (Belém/Bragança). E ela sobreviveu e leva combustível para todo o Meio Norte, até ao Ceará. Agora estamos vivendo os efeitos dessa falta. Na raiz dessa grande e até agora não resolvida cri- se está a vulnerabilidade de nossa malha de trans- porte, a totalmente estrangulada malha rodoviária e a ausência de redes ferroviária e hidroviária. So- mos totalmente dependentes dessas estradas ro- doviárias sempre estragadas e sobrecarregadas. Disse que isso ia acontecer e aconteceu. Restou-me apenas o boné que os ferroviários de deram, como sendo o "Presidente Ferroviário". Ex Presidente da República, ex senador pelo Amapá Membro da ABL eda Academia de Ciências de Lisboa; escreve no Diário do Amapá todosos domingos Revista DIÁRIO - Edição 27 - 29
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