Revista Diário - 16ª Edição - Junho 2016
G uadalajara, noMéxico, tema segunda maior feira do livro do mundo. À sua frente, somente a de Frankfurt, com uma diferença: a de Frankfurt é uma feira de negócios ligada à indústria editorial. A de Guadalajara atua nas duas pontas. É o maior evento do livro em língua espanhola, a ela comparecemosmaiores escritores la‐ tinos e, hoje, com o grande mercado ame‐ ricano de hispânicos, também é um lugar de encontro de editores e livreiros. É um festival de cultura. Mais de 200 eventos são realizados paralelamente. A cada ano existe um país convidado de honra. Em 2001, foi o Brasil, que compareceu emgrande estilo, com forte presença de intelectuais e de re‐ presentantes damúsica e do folclore brasi‐ leiro. Em Guadalajara, a cada ano, ocorre a entrega do prêmio que temo nome de Juan Rulfo ‐ o extraordinário escritor mexicano, criador de "Pedro Páramo", fonte e princí‐ pio de toda a literatura do realismomágico, responsável pela expansão da novela mo‐ derna da América espanhola. Quatro anos antes, foi ganhadora nos‐ sa Nélida Piñon, cujo prestígio, reconheci‐ mento de seu talento e de sua obra, mereceu a consagra‐ ção internacional. Ali já encontrei Vargas Llosa, García Marques, Carlos Fuentes, Enrique Krause, Fernando del Paso e reencontrei Gonzalo Celorio, Adolfo Castañón, Hernán Lara e todos os que fazem a glória das letras la‐ tino‐americanas. O Brasil levou muito tempo para saber que estava ligado a esse mundo ibérico, as nossas raízes iguais de Portugal e de Espanha. Primeiro foi preciso que essa cumplicidade fosse descoberta pela música e pelos costumes. Agora, chega a vez do livro, o vo‐ lume de tradução de autores brasileiros, a curiosidade sobre nossa literatura, sobre o que estamos fazendo, editando, construin‐ do. Os autores espanhóis já tinham invadi‐ do o Brasil, mas nós não atingíramos os lei‐ tores ibero‐americanos. A temática da América espanhola entrou muito em nosso gosto e curiosidade. É que a carga de magia, a história da conquista, a violência e a dramaticidade do esmagamen‐ to das civilizações pré‐colombianas pelos colonizadores fizeram o mistério e o barro de trabalho dos escritores. Já, no Brasil, me‐ nos do quemagia e violência, a nossa litera‐ tura é uma adivinhação poética. Machado de Assis foi considerado como o Cervantes das Américas por Carlos Fuentes, que o cha‐ mou Machado de la Mancha. A literatura é meu exílio dos 80 anos. E, como se fosse um jovem romancista em busca de leitores, estive em Guadalajara participando com extrema felicidade desse mundo fascinante das letras. A primeira pergunta que sempreme fazemé como con‐ ciliar o político com o escritor. Eu sempre respondo que omelhor é não conciliar e, sim, separar. Mas essas divagações não satisfazem os meus perguntadores. Então, para sair da conversa, provoco: os políticos gostam de elevadores, os escritores, de escadas; os políticos, de ar condicionado, os escritores, da brisa livre com cheiro de natureza! E eu vivi a vida inteira nesses dilemas e climas. E eles insistem: "O senhor o que escolhe?" Respondo: "O ar condicionado estáme fazendomal à saúde. Sou um fun‐ damentalista do livro". ● Revista DIÁRIO - Junho 2016 - 28 Senador daRepública JoséSarney Às vezes os gostos coincidem, outras vezes são antagônicos. Mas a política também tem muito de realidade e de ficção. Bismark definia a política como a arte do possível, já os intelectuais vêem a literatura como o pensar no impossível - o político com realidades, os escritores com abstrações. Ex-presidente do República, senador pelo Amapá, Membro da ABL e da Academia de Ciências de Lisboa;escreve no Diário do Amapá, todos os domingos De que gostamos POLÍTICOS ARTIGO
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